Decreto-Lei 248-B/2008

Decreto-Lei n.º 248-B/2008

de 31 de Dezembro

A Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto, aprovada pela Lei n.º 5/2007, de 16 de Janeiro, veio estabelecer um conjunto de orientações para a atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva às federações desportivas, as quais apontam para a necessidade de se proceder a uma extensa reforma relativamente à organização e funcionamento destas organizações, assente em novos princípios e valores, reflectindo acrescidas exigências éticas, para que aquelas possam responder, com eficácia, aos novos desafios com que estão confrontadas.

A reforma que ora se empreende parte de uma concepção unitária de federação desportiva, enquanto organização autónoma dotada de todos os órgãos necessários para reger a respectiva modalidade desportiva, incluindo os relativos à disciplina da arbitragem e à aplicação da justiça. Não se perfilharam soluções que se traduzissem na atribuição a órgãos exteriores às federações desportivas da competência para decidir em matérias de arbitragem ou de justiça, em nome da garantia de independência das decisões. Tais soluções, para além de não serem conformes ao disposto no artigo 46.º da Constituição da República Portuguesa, violam as normas das federações internacionais, de acordo com as quais aquele tipo de decisões deve ser cometido, em qualquer caso, a órgãos próprios das federações nacionais.

Para garantir a independência das decisões, a estratégia por que se optou passa, assim, pela democratização interna das federações e não por soluções de ingerência externa no seu funcionamento.

De entre as principais inovações deste regime jurídico das federações desportivas destacam -se as seguintes:

Em primeiro lugar, a presente reforma assenta na distinção entre federações das modalidades colectivas e federações das modalidades individuais, uma vez que são muito diversos os problemas de umas e de outras. Com efeito, nas modalidades colectivas o clube desportivo assume uma particular importância (enquanto suporte orgânico das equipas), ao contrário do que sucede nas modalidades individuais, nas quais o que sobreleva é o praticante desportivo. Nas modalidades colectivas a competitividade gera -se, sobretudo, entre clubes; nas modalidades individuais assenta nos resultados obtidos pelos praticantes individuais. E, porque assim é, as regras organizacionais devem ser necessariamente diferentes.

Em segundo lugar, estabelece -se que a representação na assembleia geral das diversas estruturas e agentes desportivos seja feita por intermédio de delegados, os quais apenas representam uma única entidade e têm um só voto.

As assembleias gerais das federações desportivas deixam de ser integradas por organizações que exprimiam votos corporativamente organizados para passarem a ser compostas por pessoas indicadas ou eleitas previamente, mas que apenas podem dispor de um voto.

Em terceiro lugar, com vista a impedir o regresso a sistemas de votos corporativamente expressos, proíbem -se os votos por procuração ou por correspondência. O que se pretende é estimular a participação dos interessados nos trabalhos das assembleias gerais, fomentar a presença e a discussão dos intervenientes e incentivar a construção de consensos entre os diferentes sectores das modalidades desportivas. As federações desportivas podem optar, salvo se a lei estabelecer regra diversa, por atribuir o direito de ser representada por mais de um delegado; mas, cada delegado apenas terá um voto.

Em quarto lugar, quer as federações das modalidades colectivas, quer as das modalidades individuais, devem reservar 30 % dos delegados para os representantes dos agentes desportivos (máxime, praticantes, treinadores e árbitros), sendo os restantes 70 % reservados para os representantes dos clubes (ou suas organizações). Nas modalidades colectivas, acresce ainda que terá de haver um equilíbrio entre os representantes dos clubes intervenientes nos quadros competitivos nacionais (35 %) e os representantes dos que intervêm nos quadros competitivos distritais ou regionais (35 %). Ao invés, nas modalidades individuais, a regra é a de que os clubes (ou as suas associações) devem, em qualquer caso, possuir o mesmo número de delegados.

Estas diferentes formas de ponderação do número de delegados asseguram que nenhum sector, nenhuma área da actividade desportiva, por si só, possa impor a sua vontade ao conjunto da modalidade desportiva.

Em quinto lugar, as eleições dos órgãos federativos colegiais (conselhos de disciplina, de justiça, de arbitragem e fiscal), com excepção da direcção, deve processar -se através de listas próprias, por voto secreto, de acordo com o princípio da representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt. Pretende -se com esta regra, por um lado, impedir as listas únicas, com prévia negociação de lugares, e, por outro, assegurar a representação das minorias nos órgãos de justiça e de arbitragem, o que tornará mais transparente o funcionamento desses órgãos de natureza muito sensível e contribuirá para um acréscimo de auto -fiscalização do seu funcionamento. Estas regras são completadas por duas outras destinadas a assegurar que não sejam estabelecidos entraves desproporcionados à apresentação de candidaturas alternativas, estabelecendo um limite ao número exigível de subscritores das listas (10 % dos delegados) e determinando que as listas podem ser apresentadas apenas para determinado órgão.

Em sexto lugar, consagra -se um novo órgão eleito directamente, unipessoal, e com poderes reforçados — o presidente da federação. Com competências distintas da direcção, à qual preside, o presidente é o último responsável pelo executivo federativo e o garante maior do regular funcionamento dos demais órgãos.

Em sétimo lugar, são reforçados os poderes dos executivos federativos, a fim de que possam executar o programa para o qual foram eleitos. Nesta óptica, atribui -se à direcção a competência para aprovar todos os regulamentos federativos.

Esta nova competência da direcção é temperada pela possibilidade de 20 % dos delegados requererem a respectiva apreciação em assembleia geral para suspender a sua vigência ou introduzir alterações.

Em oitavo lugar, estabelece -se uma regra geral para a renovação dos mandatos dos titulares dos vários órgãos federativos, de acordo com a qual ninguém pode exercer mais do que três mandatos seguidos num mesmo órgão de uma federação desportiva, salvo se, à data da entrada em vigor do presente decreto -lei, tiverem cumprido ou estiverem a cumprir, pelo menos, o terceiro mandato consecutivo, circunstância em que podem ser eleitos para mais um mandato consecutivo.

Em nono lugar, clarifica -se que as organizações de clubes (ligas e associações distritais ou regionais), com funções de organização, disciplina e promoção da modalidade na sua área de intervenção, exerçam tais funções por delegação da federação desportiva em que se inserem: todas estão subordinadas às orientações provindas da federação e esta tem os meios necessários para fazer valer as suas orientações.

Em décimo e último lugar, estabelece -se o princípio da renovação quadrienal da atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva, garantindo -se assim um reexame periódico das razões que justificaram a atribuição inicial daquele estatuto, o que será concretizado em períodos coincidentes com o de cada ciclo olímpico.

Assim:

No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.º 5/2007, de 16 de Janeiro, e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte: